Thursday, November 29, 2007

O livro mais esperado

Estava eu hoje aqui no lóbi do Hotel Trópico a folhear uma revista ao pequeno almoço e de repente vejo esta preciosidade.



Caraças, será que depois disto vou conseguir comprar o mais recente livro, qd regressar a Lisboa?

Monday, November 26, 2007

My smile

Hoje acordei e tinha um sorriso.
Estava nos meus lábios e brilhava-me nos olhos.
Hoje, a confusão da cidade que não pára parece-me uma doce dança e o seu som forte, uma quente canção.

Quente como o sol que sorri – também ele – e que empresta este toque de luz brilhante à cidade, que se engalanou de cores alegres.

Tudo isto para mim e para o meu sorriso. Para me dizer que me compreende e sorri comigo.

Embora seja uma sensação estranha e difícil de ‘realizar’, acho que se chama felicidade. Tomara que não parta de novo.

Thursday, November 01, 2007

De vez?

Estou há muito tempo sem escrever. A todos os que me perguntam, vou tentando desculpar-me com o tempo ou o trabalho. Na verdade, não sendo isso mentira, há outras razões bem mais profundas para a ausência de escrita.

Desde que me separei, algures em 2004, entrei numa espécie de espiral depressiva, por vezes controlada e mesmo esquecida, mas outras vezes, de difícil fuga e verdadeiramente limitadora.

Angola acabou por se revelar – embora, honestamente, eu não o esperasse – uma forma de sair do turbilhão de emoções que teimavam em me manter infeliz.

Com o tempo, a rede de relações que criei em Angola tornou-se mais forte. A Ana, especialmente, mas para além dela e depois dela, muitas outras pessoas perceberam o quanto eu precisava delas e souberam estar lá, mesmo sem eu pedir.

Descobri que o ambiente humano é diferente, em África. Não só entre os expatriados, que partilham esta distância que nos torna mais próximos, mas também o calor e alegria do povo Angolano se tornou um bálsamo difícil de dispensar.

Descobri que aqui posso, de facto, ajudar outras pessoas; não só profissionalmente, mas também na vida, há aqui pessoas muito necessitadas e descobri que parte da minha felicidade passa por trazer felicidade aos outros. Sem os cinismos e competitividade fútil de Lisboa, em que mais um punhado de Euros parecem ser um fim que justifica qualquer meio.

Aos poucos, o sofrimento que sentia ao partir de Lisboa para Luanda, inverteu-se e hoje, custa-me tremendamente mais deixar a minha vida em Angola para regressar em Lisboa. Filha à parte, sinto-me cada vez menos ligado a Lisboa; não à cidade, que amo de paixão, mas à vida e sociedade.

A partir do momento que aceitei estes sentimentos, ficou evidente que, para ser feliz, tinha que fazer alguma coisa.

A decisão foi tudo menos fácil. Mas um grupo de pessoas excelentes e muitas horas de psicoterapia, acabaram por me deixar uma única via aceitável. Decidi assim esta semana, que pretendia que o meu futuro passasse por África.

Assumi que pretendo – com o actual ou outro empregador – trabalhar em África e procurar encontrar-me aqui. Não sei se por muitos anos, se por poucos. Já vivi demais para ainda acreditar que se podem ter essas certezas, mas sei que neste momento, é em Angola que quero estar.

Ter conhecido a Sylvie, ainda mais viajada que eu, fez-me perceber que não era um sentimento contra-natura, esta coisa de querer deixar a ‘civilização’ e sentirmo-nos felizes num outro sítio que maior parte dos nossos amigos considera inabitável.

Se calhar, precisava também destes novos amigos.

A todos os que me ajudaram neste percurso interior, o meu mais profundo obrigado. Vocês sabem quem são!

Monday, October 15, 2007

Algo que eu já devia ter aprendido

A solidão e sua porta

Quando mais nada resistir que valha
a pena de viver e a dor de amar
e quando nada mais interessar,
(nem o torpor do sono que se espalha).

Quando pelo desuso da navalha
a barba livremente caminhar
e até Deus em silêncio se afastar
deixando-te sozinho na batalha

a arquitectar na sombra a despedida
do mundo que te foi contraditório,
lembra-te que afinal te resta a vida

com tudo que é insolvente e provisório
e de que ainda tens uma saída:
entrar no acaso e amar o transitório.


Carlos Pena Filho


Os meus agradecimentos à Pacanina

Thursday, October 11, 2007

Há coisas que não mudam

Parece que não escrevo aqui há muito, e é verdade, tenho andado por África, mas na verdade, na verdade, ainda que quase tudo se mantenha igual, a minha vida está cheia de cor, senão vejamos:

Tenho noites em branco, sorrisos em amarelo, dias em púrpura, fins de semana em azul, sonhos em rosa e negro... e até tenho cabelos cinzentos.

Ufa, tantas cores.

Tuesday, July 17, 2007

when?



Porquê?
Porque persistem em existir grossas lágrimas me rolam pelo rosto?
Porque acordo sufocado mais vezes que as que me deixo a mim mesmo saber?

(…)Oh, Angie, Oh, Angie, when will those dark clouds disappear (…) *



Quando voltarei a sorrir? E quando serão reerguidas dos escombros, as paredes de mim?

(…)All the dreams we held so close seemed to all go up in smoke (…) *


Porque é a dor mais funda, aquela que é por ti, pela tua própria dor? Aquela que sinto quando me lembro que te dói como a mim?
Terás tu a resposta?

(…) Oh, Angie, don't you weep, all your kisses still taste sweet (…) *


Saberás tu quando vou poder respirar sem esta dor que me aperta? Quando poderei deixar de fingir que sou forte?

Desaparecerá um dia este fosso que não nos deixa aproximar?

(…) But angie, I still love you baby, ev'rywhere I look I see your eyes
There ain't a woman that comes close to you, come on baby, dry your eyes (…) *







* Angie, The Rolling Stones

Monday, July 16, 2007

Conto para maiores de 18

Sentados à mesa, enquanto decorria o que aparentava ser um normal almoço entre amigos, a conversa fluia fácil e absorvente. No entanto, quem olhasse mais atentamente poderia ver que os olhares deles se cruzavam com mais frequência que o normal e que exprimiam desejo e aquele brilho especial da paixão.

Os cabelos negros e compridos dela caíam sobre um rosto bronzeado e bonito. Ela era sem dúvida uma mulher muito atraente e ele não conseguia desviar o olhar dos límpidos lagos que eram os olhos dela. E tão pouco conseguia disfarçar a indesmentível atracção.

Ela sorria, claramente se apercebia do que diziam os olhos dele e a ideia agradava-lhe. Entendiam-se muito bem, ela fazia-o rir e ele transmitia-lhe uma calma doce que ela não sentia há muito. Aqueles almoços repetiam-se aliás em função disso, desse sentimento que crescia dentro dela e dentro dele.

Saíram do restaurante para a rua, onde um lindo dia de sol os esperava. Caminharam lado a lado durante alguns metros e por fim, ele abrandou o passo, segurou na mão dela fitou-a nos olhos. Ela retribuíu o olhar, doce e expectante

- E se em vez de ir trabalhar, entrarmos no carro e formos apanhar sol na barriga, numa esplanada junto ao mar?

Ela sorriu, apertou-lhe a mão com força e assentiu com um ligeiro aceno de cabeça.

Entraram no carro dele e partiram. Passaram a ponte deixando a grande cidade para trás e já na auto-estrada as suas mãos tocaram-se, primeiro por acaso, depois por desejo e apertaram-se com força. Ela sorriu e acariciou-lhe o braço. Um arrepio de felicidade e prazer percorreu o corpo dele.

Algures numa estrada no litoral a sul de Tróia, decidiram entrar por um caminho de terra e poucos kilómetros depois deparou-se-lhes um cenário fantasticamente belo. Um areal deserto em toda a sua extenção, um mar de azul límpido e o hipnotizante verde do pinhal... era um sítio encantador.

- Oh, aqui não tem explanada! – exclamou ela com beicinho claramente forçado.

Ele riu-se e chamou-lhe tonta. Saíram do carro e caminharam até ao cimo da duna. Deram as mãos, olharam um para outro e as suas bocas aproximaram-se. Primeiro os seus lábios mal se tocaram, num encontro tímido e fugaz, mas depois as suas bocas uniram-se num longo e apaixonado beijo. Beijaram-se longamente, com uma sofreguidão de quem esperou muito tempo por este momento. Ele conseguia sentir o coração dela a bater forte junto ao seu, o seu cheiro, o seu sabor e arrepiou-se de prazer.

Abraçaram-se e deixaram as suas mãos explorar livremente os corpos um do outro. Ele levantou docemente a camisola branca de algodão dela, enquanto lhe beijava o pescoço, até revelar o seu peito lindo. Sorriu-lhe e desceu, beijando-o, enquanto ela fechou os olhos de prazer. Ela desfez o nó da gravata dele e lentamente foi abrindo os botões da camisa, para por fim o deixar de tronco exposto, à mercê das suas carícias e beijos.

Ele pegou nela e levou-a até junto do carro. Enconstaram-se ao carro envolvidos num abraço meigo. Ele deixou as suas mãos deslizarem para dentro dos jeans dela e depois para dentro das suas cuecas e sentiu o seu sexo quente. Ela desapertou o cinto das calças dele, depois o botão e deixou-as cair. De seguida, desapertou o botão dos jeans e ficaram assim nus a olhar-se.

Ela começou por lhe beijar o peito, por lhe apertar as nádegas e o mordiscar levemente; depois ele agarrou-a, beijou-a e encostou-a ao carro e encostou o seu sexo duro ao dela e penetou-a. Fizeram amor ali mesmo e quando a respiração ofegante de ambos indiciou que estavam a chegar ao orgasmo, beijaram-se com sofreguidão e apertaram-se num abraço terno do qual desejaram nunca mais sair.

Quando finalmente se soltaram do abraço, riram ao constatar que as roupas estavam espalhadas pela areia e seria impossível voltarem ao escritório com ar decente naquele dia. Brincaram na areia, tentando esconder as roupas um do outro e acabaram no carro, com as roupas desalinhadas, a caminho de casa dela.

Saturday, July 14, 2007

O direito a não pensar

Se há um direito que eu gostava de ter, esse era o direito a não pensar. Não sei sequer se é uma questão de direito ou de capacidade.

Gostava de conseguir, com ou sem ajuda de alegria química, esquecer o que me dói, o que me magoa e viver a vida livre das amarras que não me deixam ser feliz.

Sinto que as partes e pessoas da minha vida que não têm culpa, não deveriam ter que conviver com um 'eu' infeliz. Gostava que o sorriso que vêm pudesse ser sentido. Que a felicidade que percebem, fosse mais que um avatar que me permite esconder.

Mas não consigo. E lamento-o a cada dia, a cada hora.

Thursday, May 31, 2007

Desabafo

Sempre que ouço aquelas três meninas da TV Cabo a tocar: TRRIMM-TRRIMM, TRRIMM-TRRIMM, só me apetece pegar nelas e.... mudar-lhes o toque!

Friday, May 04, 2007

Gosto



Às vezes fecho os olhos e quase posso jurar que consigo sentir o teu cheiro e o toque da tua pele.

Não estás lá, eu sei, mas queria muito que estivesses.

Gosto do teu sorriso e do conforto aconchegante que ele me provoca. Da sensação pacificadora de um quente regresso a casa, especialmente importante nesta altura não me sinto em casa em lugar nenhum.

Gosto de saber que estás aí e que basta o teu olhar para que nada mais importe. Gosto do sabor do teu cabelo e do sal da tua pele, quente, quando fazemos amor.

Longe ou perto, gosto muito de ti.



Imagem daqui

Monday, March 19, 2007

Eu?

Agora que penso nisso, creio que nunca tinha escrito aqui um post na primeira pessoa. Tinha falado de mim, é certo. De uma forma ou de outra, o que escrevo sempre reflecte um pouco de mim. Mas assim não.

De qualquer forma, hoje apetece-me fazê-lo. E portanto, faço-o!

Apetece-me contar que estou a ler o Planisfério Pessoal do Gonçalo Cadilhe. Que partilho com ele este gosto por ter sempre a mala pronta.

Foi talvez por isso que decidi escrever assim. Apeteceu-me partilhar o quanto adoro algumas pequenas coisas que só as viagens permitem: experimentar novas culturas, sentir novos sabores... ou coisas tão simples como cheirar novas terras e sentir um sol diferente acariciar-me a pele.

Há quase um ano que vivo de mala feita, viajando - por motivos profissionais - de e para África a cada poucas semanas. Tem sido duro, mas não tanto que consiga esquecer o quanto tem sido maravilhoso.

Há todo um lado de aprender a estar conosco sozinhos, quando se viaja. São as horas dentro do avião e são depois as longas semanas sem qualquer cordão umbilical que nos ligue à família e amigos. Mas também por isso, estamos muito mais receptivos a descobrir novas pessoas e fazer amizades.

É toda uma experiência que, por muito que se tente descrever, só se percebe verdadeiramente quando é 'experimentada'.

Friday, March 16, 2007

Assim foi

I got up in the wrong side of bed.

Primeiro sim, era isso. Depois foi o calor. O barulho. A multidão. A confusão de estar só e nem me conseguir escutar a pensar. Pessoas que correm, carros que gritam, prédios que buzinam.

Queria ser uma pedra, parada no cimo de um monte. Queria ser um electrão, que corre sem parar. Uma palavra que entra e rodopia na cabeça antes de repousar arrumada.

Depois não queria nada. Queria tudo, também. E já agora, queria que fosse já.

Actually... turns up, I got up in the wrong side of me.

Friday, October 27, 2006

Não acredito

Naquele dia, ‘ele’ decidiu falar-nos e lá de cima, do alto do monte Canaa, perto do povoado onde vivia Pedro, ‘ele’ dirigiu-me a palavra.

- Que te enfada Miguel?
- Enfadam-me os homens – respondi – enfadam-me os homens…
- Enfada-te o que fazem?
- Não. Enfada-me o que não fazem, o que não sentem, o que não pensam.
- E é só?
- Não! Sobretudo, enfada-me que olhem o mesmo que eu, mas apenas sejam capazes de ver o que desejam.
- Mas Miguel, não vives tu entre os homens desde sempre?
- Sim.
- E desde sempre sabes que é deles a liberdade de fazer o que desejam, com o que ‘ele’ lhes deu.
- Sabes – disse por fim – é por isso que não acredito n’ele. E nem em ti.

Friday, September 22, 2006

Chega Aqui

Chega aqui,
senta-te do meu lado e partilha comigo este momento
escuta o vento soprar, e vê comigo os cereais dançar,

Entra em mim, vê o que eu sinto
e sente o que eu vejo

Aperta a minha mão na tua
faz-me sentir amado
e pequeno, por uma vez protegido e mimado

Deixa-me baixar a guarda,
descansar uns momentos
sentir que posso ser eu e despir esta farda

Senta-te do meu lado,
olha os mesmos campos
e dança comigo a mesma música que os embala

Ou, simplesmente,
Olha os meus olhos e diz-me o que vês,
Diz-me se o azul é o do céu ensolarado, ou do escuro mar profundo

Se estão transparentes ou turvos
Se brilham ou estão enevoados,

Diz-mo por favor, preciso ter a certeza que sabes o que sinto.

Wednesday, September 20, 2006

Viagem

O relógio digital no centro do tablier marcava 3.24h. O carro deslizava veloz e solitário pela auto-estrada. O rádio estava ainda mudo, porque os seus pensamentos fervilhavam ainda num turbilhão aparentemente sem saída e ele queria escutar tudo o que se passava dentro da sua cabeça.

Conduzia depressa, mesmo sem se dar conta. Sem sequer pensar nisso, tentava deixar entre si e os seus problemas a maior distância possível, alheio à inutilidade da distância na resolução de tudo o que acontecera. O coração batia forte e conseguia senti-lo no peito, ameaçando explodir a cada batida.

Flocos de neve começaram a colar-se ao pára-brisas e obrigaram-no por um instante a desviar a mente do que o atormentava. Ligou as escovas na velocidade máxima e decidiu abrir o vidro. O vento gelado atingiu-o como um objecto cortante, mas esse instante com o pensamento nas coisas triviais, soube-lhe bem e decidiu prosseguir com o vidro aberto... pelo menos até não suportar mais a dor gelada, o que aconteceu uns 3kms mais à frente.

Voltou a fechar o vidro e tocou no ‘on’do rádio. Tinha um cd de Radiohead que deixou a tocar baixo. À mente regressaram os eventos que desencadearam esta viagem. Na verdade não sabia bem o desfecho da viagem... sabia que tinha que se sentar no carro, carregar no acelerador partir. Não tinha decidido o destino daquela viagem e pelo menos até a luz laranja da reserva de combustível acender, não se ia preocupar com isso.

Sentia uma dor insuportável no peito, que queria libertar pisando mais forte o acelerador..180...190...210km/h, o som do vento fê-lo olhar para o conta kilómetros, mas não abrandar. Sentia-se cobarde pela fuga, mas nem tinha ainda a certeza de que fosse um fuga. Podia estar apenas a tentar encontrar o sentido da sua existência, ou o bálsamo que lhe aliviasse o sofrimento. Não sabia, essa era a verdade.

Alguns kilómetros mais à frente, teve uma nova chamada à realidade, as luzes intermitentes e rotativas de carros de polícia e uma ambulância fizeram-no abrandar a marcha. Quase parou... estava um carro capotado no centro da via, antecedido por indesmentíveis traços de despiste pintados a negro na alva neve que cobria o asfalto. O polícia obrigou-o a deter a marcha e depois de lhe pedir para abrir o vidro pediu paciência, mas que teria de aguardar que removessem o carro. Tentando apenas parecer interessado, perguntou pelos ocupantes; era uma só pessoa, tinha falecido. Demasiado absorto na sua dor nem realizou as palavras do polícia.

Quando finalmente o deixaram avançar, a sua vista cruzou o carro destruído em cima do reboque e recebeu um soco no estômago, daqueles que nos deixam estendidos no tapete até bem depois do árbitro contar até 10. Instintivamente parou e procurou a placa de matrícula no meio da chapa retorcida.

Debruçou a cabeça sobre o volante e chorou convulsivamente. Desligou o carro compreendendo que a sua viagem terminara e adormeceu em paz.

Friday, September 15, 2006

My favorite things

Hot chocolate
Happy endings
A beautiful smile
A room with a view
Candle light dinners
To hear ‘I love you’
Holding your sweet hand
Dreaming that I have wings

These are a few of my favorite things

Wednesday, September 13, 2006

A sala

Abriu os olhos lentamente, a despertar de um sono profundo. Uma névoa na vista não o deixava distinguir os objectos à sua volta o que o deixou um pouco confuso.

Aos poucos, a visão tornou-se menos turva e quanto mais nitidamente via, maior a sua confusão. Mas que sítio era este em que estava? O que estava ali a fazer? Como fora lá parar?

Estava num quarto branco. Completamente branco, sem uma janela, sem um mínimo toque de outra cor. Apenas quatro paredes a formar um espaço cúbico, liso e apenas umas lâmpadas fluorescentes brancas colocadas no tecto quebravam a lisura do que o rodeava.. Ergueu-se ligeiramente e percebeu que estava numa cama de ferro, branca, coberto com um lençol, também ele branco.

Sentiu algo a prender-lhe o braço esquerdo e, para sua surpresa, viu um catéter introduzido na veia, ligado por um tubo plástico a um saco de soro pendurado sobre a cama. Afinal parecia estar num hospital.

Mas como teria ido ali parar? A última recordação que tinha era de se ter deitado na noite anterior. Não imaginava o que pudesse ter acontecido, nem quanto tempo teria decorrido.

Dois eléctrodos no peito e um num dedo da mão direita, ligavam-no por fios a um aparelho que emitia um regular beep-beep. Isso não o deixou particularmente confortado.

Excepção feita ao beep da máquina atrás de si, não se ouvia nenhum outro som. Gritou, chamou por alguém, mas não obteve resposta, apenas o beep-beep a quebrar o silêncio a intervalos regulares.

Tomou então consciência de uma dor aguda no peito e levando as mãos ao local, percebeu uma costura. Mas que raio se estaria a passar? Decidiu virar-se para trás e encarar a máquina dos irritantes beep-beep. O que viu fê-lo empalidecer tanto quanto as paredes do quarto. Uma linha de cor verde – a única cor no quarto todo – atravessava o monitor, mas a linha era plana! Olhou de novo e confirmou a pequena inscrição junto à linha ‘heart rate’... como era possível ele estar a ver a sua própria linha do coração plana? Isso significaria que estava morto! Não, não era possível. Mas... por outro lado, explicaria o absurdo da situação. Estaria ele numa sala do purgatório? Não, não podia ser.

Foi interrompido pelo som de passos... daquilo que antes parecia apenas uma parede branca, abriu-se uma porta e entrou um homem alto de meia-idade. Era magro, de rosto afilado e nariz aquilino, cabelo curto, escuro e penteado para trás com gel. Tinha uma roupa branca vestida, o que não causou estranheza. A visão de um estetoscópio ao pescoço trouxe-lhe um alívio indescritível, afinal era um médico.

- Sr Doutor, por favor, onde estou? Que se passou?
- Ah, vejo que já acordou, óptimo.
- Mas que se passou, onde estou eu? Porque estou aqui deitado e porque é que aquela máquina tem a minha linha cardíaca plana?
- Calma, calma – retorquiu o médico – uma coisa de cada vez. Você foi trazido para aqui de urgência, esta noite. Foi-lhe diagnosticado um problema grave no coração e teve que ser sujeito a uma intervenção cirúrgica.
- Ao coração? Mas... eu nunca sofri do coração... que se passou? Que tiveram que fazer?
- Infelizmente, tivemos que lho retirar... estava estragado...

Tuesday, September 12, 2006

Na reunião

- Olá, bom dia, como estás?

Sigo indiferente, aceno ligeiramente com a cabeça e avanço em direcção à máquina do café. Carrego no botão, preparo o copo de plástico e inspiro profundamente.

Olho em redor. Está escuro e a chuva lá fora faz um ruído ensurdecedor no tecto metálico. Suspiro de novo. Por não estar em casa, na cama, a recompôr-me de uma noite curta, demasiado curta; por estar aqui, contrariado, à espera de pessoas de quem não gosto, para uma reunião que não queria ter.

Um discreto beep indica que o café está pronto. Agarro no copo de plástico com uma mão.

- Foda-se!

Queimo o polegar e o indicador. Enquanto pouso o copo à pressa e deixo os dedos debaixo de água fria corrente, penso no quanto desejava gritar e ir-me embora.

Avanço por fim para a sala. Empurro a porta e constato que ainda ninguém chegou. Escolho uma cadeira, ligo o portátil e enquanto ele arranca encosto-me para trás.

De repente abro os olhos e estou enfiado numa camisa caqui, com umas caças largas com bolsos laterais, umas botas de montanha e um chapéu. Caminho sozinho, com um enorme cão de raça indefinida a meu lado. Está calor, mas não demasiado. Há no ar um cheiro a deserto. Sorrio. Não preciso esforçar-me muito para perceber que estou no Atacama.

Caminho em passos largos em direcção ao Jeep preto estacionado ali. Salto para o interior e o enorme cão acompanha-me. Rodo a chave e acordo o rouco 6 cilindros. Arranco e sinto um arrepio de prazer enquanto o vento fresco da manhã me acaricia o rosto. Afago o cão, que me corresponde com uma lambidela. Naquele momento tenho pena dos pobres infelizes que vivem enclausurados em escritórios, espartilhados por um fato e uma gravata, na insensata convicção de que a felicidade depende de mais uns euros ao fim do mês.

E rio-me, por me saber um deles.

Friday, September 08, 2006

O Verão que era e o Verão que é

Lembro-me bem de como antes era o Verão. Era uma verdadeira instituição. Era um tempo de férias, três meses e meio delas, para ser mais exacto. Todos ansiávamos a chegada dessa época, antevendo mentalmente as roupas que finalmente poderíamos usar e os milhares de coisas que podiam ser feitas, debaixo do tórrido calor de um Verão à séria.

Estava eu no secundário e a mais excitante novidade na Lisboa de então, eram os termómetros digitais em dois ou três pontos da cidade. Como um dos ditos ficava a poucos quarteirões do colégio, a chegada do Verão era efectivamente comprovada por várias visitas diárias ao mesmo para aferir das qualidades do Verão que chegava, medidas pela proximidade da mágica marca dos 40º. E nos Verões de então, tal acontecia mesmo. Chegámos a festejar uns fantásticos 42º medidos ali mesmo à nossa beira, no termómetro gigantesco pendurado na linha do comboio por cima da Av. Da República. Era um verão à séria!

Com a chegada do Verão, era altura de trocar os amigos do colégio pelos primos e os amigos destes. Era uma troca curiosa esta. Saía do Campo Pequeno e rumava para o “ameno” Alentejo, de onde, invariavelmente, regressava três meses depois (interrompidos apenas por uma quinzena no Algarve) com um sotaque à Verão, ou Alentejano, para os mais puristas.

Eram tempos de verdadeiro aproveitamento da estação. A actividade mais habitual consistia em pedalar pelos campos, com o farnel preparado pela minha tia no “suporte” da bicicleta, sob um inclemente sol Alentejano, procurando cada dia uma nova barragem onde nadar e pescar, ou um jacto de rega nos campos de girassóis, que nos regasse também enquanto descansávamos deitados no chão. Se efectivamente a pesca fosse mais que uma mera diversão e conseguíssemos enganar algum Achigã, Carpa ou Barbo, então nessa noite havia fogueira e peixe grelhado.

Eram meses de novas experiências, porque todos os anos havia actividade novas. Um ano, o meu tio tinha comprado um rebanho de ovelhas e ao meu primo e a mim, cabia a “dura” tarefa de as levar ao campo de pasto ao anoitecer; claro que geralmente fazíamos corridas montados nas ovelhas, até cair ao chão, ou até o macho do rebanho se fartar e nos atirar ele próprio. Outro ano, havia a enfardadeira novinha do tio e não descansámos enquanto não fomos com ele, passar dias inteiros empoleirados nos gigantescos guarda-lamas do tractor, a ver aquela máquina que engolia filas intermináveis de cereal ceifado, espantando à sua frente assustados coelhos. Eram dias de uma diversão que não se explica, pela emoção dos campos de restolho a perder de vista, os mergulhos nas barragens, os almoços de atum em lata comidos debaixo de um chaparro, antes da muito Alentejana sesta. Tudo acompanhado de quilos de poeira e palha, entranhados na roupa, na pele e no cabelo. Cheirava a palha, a Alentejo e a Verão.

As noites, essas jamais as esquecerei; ficávamos sempre no terraço da casa, deitados sobre um colchão, com um cobertor aos pés na eventualidade de uma madrugada mais fresca e adormecia sempre a olhar as estrelas.

Este é o Verão que era. O contraponto às amenas estações intermédias e ao austero e civilizado Inverno, passado na cidade. Uma peça importante daquilo que sou hoje.

O Verão que é, já não é o Verão que era. No Verão de hoje, reduziram as férias a duas ou três semanas. A esta distância, 40º parecem irreais e só se formos a alguma cidade do Norte de África ou do Médio Oriente.

No Verão de hoje, as noites são frescas e quando saímos à rua, não sabemos se antes do fim do dia ainda vai chover. As pessoas continuam a trabalhar, não se dando conta de que é Verão. O stress é quase o mesmo do resto do ano e apenas o mês de Agosto, ainda que passado em Lisboa, se aproxima dos tempos de outrora, pelo reduzido número de pessoas que por aqui andam.

No Verão de hoje, o meu primo já não está connosco e aos seus amigos, já nem os conheço. As ovelhas foram vendidas e a enfardadeira ganha ferrugem debaixo de um sobreiro. É quase como se o Verão estivesse fechado, à espera que alguém lhe pegue e o restitua ao esplendor de outros tempos. Ou se calhar, o Verão que é ainda é o mesmo; nós é que não.

Thursday, September 07, 2006

Odeio que gostes de mim e gosto de te odiar

- Olha, gostas de mim?
- Não, odeio-te!
- Mas muito?
- Muito não, mas assim um bocadinho.
- Oh... odeia-me mais.
- Não! Nem penses, já tens sorte em te odiar pouco, não queiras abusar.
- Oh pah... mas achas que com o tempo tenho hipóteses.
- Não sei! Não sei o futuro. Hoje odeio-te pouco, talvez amanhã te odeie mais, mas não sejas chata.
- Vá lá.
- Não sejas chata!
- Oh pah!
- Bem.... já começo a odiar-te mais.
- A sério? YEAH! Toma um beijo... XUAC!!
- Bem, assim estragaste tudo, quase que estou a gostar de ti.
- Oh, foda-se! Não quero. Odeia-me, já!
- Eu até queria, gosto de te odiar, mas que queres. Nem sempre é fácil odiar alguém.
- Tenta, de certeza que tenho coisas más que podes odiar.
- Imagino que sim, mas isso não chega... só te odeio um bocadinho, lamento.
- Bolas, pah, ninguém me odeia como mereço!