Thursday, July 09, 2009

Atom-Bunker Mobile

Richard Corr estava de férias na Alemanha rural com os amigos da faculdade. Já há 13 anos que regularmente iam uma semana para um destino estranho - sempre diferente - escolhido pelo método do destino com menos votos, numa votação que faziam a 31 de Dezembro de cada ano, no Pub local.

Neste ano calhou a Alemanha profunda, em Urach, uma pequena vila onde nada acontecia, o tempo passava devagar e ninguém falava Inglês. Um requisito sempre auto-imposto nestas viagens. Tinham decidido alugar uma quinta e divertiam-se em festas e passeios de jipe pelos montes circundantes.

Naquele dia, Richard estava com Norm na beira da estrada a recolher lenha para mais um churrasco épico, quando um som rouco e descompassado de um grande camião em esforço os fez erquer a vista; Richard reconheceu imediatamente um Opel Blitz de 1944, utilizado na segunda guerra mundial pelo exército Nazi. Como apreciador de clássicos, ergue-se e observou melhor. Era um modelo militar, completamente restaurado, com a insígnia nazi e que transportava na caixa de carga uma espécie de contentor com pequenas janelas corridas junto ao tecto. Em caracteres brancos pintados no verde militar, dizia: Atom-Bunker Mobile. Bunker Atómico Móvel.

Richard ficou fascinado. Não só não fazia ideia da existência de um tal coisa na segunda guerra mundial, como o facto de estar ali a passar lentamente ao seu lado o hipnotizou. Aproveitando a lentidão do camião, claramente em esforço pelo peso e a subida que enfrentava, Richard Corr correu atrás do camião e saltou para cima da caixa de carga. Abriu a porta do Bunker Atómico Móvel e entrou. No seu interior, apenas filas de bancos corridos, forrados a napa castanha, mas ao centro, uma cadeira erguida, como se de um trono se tratasse. Richard aproximou-se e leu as letras ‘Der Fuhrer’ gravadas no encosto.

Ainda não tinha digerido este momento, quando um solavanco e um rugido do motor o depertaram. O camião ganhou repentinamente uma energia e uma velocidade absolutamente inesperadas. Circulavam seguramente a mais de 90km/h, era completamente impossível sair do camião em andamento e, de dentro do Bunker Atómico Móvel, era também impossível o menor contacto com o condutor do mesmo.

Surpreendido por ser de repente ‘prisioneiro’ do Bunker Atómico Móvel, Richard Corr resignou-se a aproveitar a espera até que o camião tivesse que abrandar, para se sentar no cadeirão ao centro e olhar pelas estreitas janelas.

Pelas janelas desfilavam árvores, ocasionalmente casa ou animais... todo um mundo e Richard sentia-se um mero espectador, fechado no seu bunker (atómico móvel) e condenado a ver a vida a passar sem ter a menor capacidade de intervir ou decidir sobre o destino. Refém de uma decisão que parecia inocente, Richard começou a ficar preocupado. Não fazia ideia em que direcção seguia, não tinha telefone, documentos ou dinheiro consigo e – tal como tinham escolhido – estava numa sítio onde ninguém falava Inglês.

Finalmente, o camião abrandou. Quase parou, na verdade. Numa rua larga no interior de uma pequena aldeia e sem motivo aparente, mas Richard não se preocupou com isso e precipitou-se para a porta. Saltou e o Bunker Atómico Móvel arrancou de novo, como se tivesse apenas abrandado para que Richard Corr retomasse controlo da sua vida.

Controlo da sua vida? Essa mesma questão corria pelo cérebro de Richard; estar perdido sem fazer a menor ideia de onde, sem contacto, dinheiro, documentação e sem conhecer a língua, não era exactamente o controlo que Richard Corr gostaria de ter.
Enquanto caminhava pela estrada, sem saber bem onde esta o levava, Richard percebeu então a suprema ironia do acontecimento. Era a sua vida toda que estava fechada no Bunker Atómico Móvel. Era lá que ele residia, impotente para decidir ou influenciar a direcção e velocidade dos acontecimentos ao seu redor.

E foi nesse momento que abriu os olhos e olhando no rosto divertido de Norm e da sua amiga Katie, percebeu que não devia ter comido aqueles cogumelos ‘mágicos’ na noite anterior.

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